14 de ago. de 2011

Ode à Impotência

Esta semana foi um turbilhão de emoções, tanto no emprego quanto na minha vida pessoal; e já que me foi cedido este espaço, decidi fazer melhor uso dele, da única forma como acredito fazer de forma razoável, escrever.
Escrevo porque às vezes, na solidão do meu quarto, ao som de músicas nostálgicas e melodias sofridas falando de amores perdidos e corações destroçados as idéias parecem fervilhar. Todos sabem disso: as músicas tristes servem pra liberar o melhor de nós, pra purgar todas as aflições da nossa alma inquieta nestes tempos modernos.
Assim sendo, escrever pra quê? Escrever pra quem? Escrever sobre músicas tristes?
Não, escrever uma ode à impotência.
E não é da incapacidade de ereção que eu estou falando.
Impotência: Falta de Poder, Força.
Muitos poderiam se perguntar o por que deste tema tão controverso, quando eu deveria estar evocando a sagacidade, a tenacidade, a coragem, uma infinidade de sentimentos e sensações boas.
Mas quem somos nós sem as nossas tristezas e agonias? Que valor damos às conquistas quando não sabemos o que é perder? Somos então crianças mimadas, fazendo birra quando nossa mãe não compra o brinquedo caro que queremos.
Certa vez eu li que “músicas tristes são populares em karaokês porque todos queremos escapar da mágoa que sentimos”, mas e se pensar que, em vez de escapar, reconhecemos nossa própria impotência diante de certos eventos do mundo, e essas músicas tristes nos consolam, dizem que não estamos sós, que um sem número de pessoas se identifica conosco?
Não me levem a mal, mas eu não me preocupo muito com desastres mundiais, sempre fui assim. Me entristeceu profundamente o acidente com as usinas nucleares no Japão, mas fez muito pouca diferença na minha vida comparado com a greve dos professores no Rio de Janeiro. Eu sei que milhões morrem de fome todos os anos no mundo, mas me preocupo mais com a merenda dos meus alunos diante dos sucessivos cortes de orçamento.
Mais do que as coisas que eu SEI e POSSO fazer, são as coisas que eu não sei e não posso fazer que me definem. Esta semana eu tive que aturar uma aluna a me dizer que eu não sou amigo, não sou companheiro, não olho meus alunos como meus iguais, que não os trato de igual pra igual, ao que eu respondi que realmente, eles não são meus iguais. São alunos, e eu professor; e eu cumpro meu papel social que é ENSINAR na escola, e não tenho nenhum interesse em saber se eles foram no Pagofunk da Quadra da Marmita, ou se foram no Culto das Línguas de Fogo e Jesus operou milagres.
A aluna ficou ofendida, foi reclamar com a Direção, e eu fiz questão de voltar à sala de aula com o corpo diretor e dizer que sou o que sou, gostem de mim ou não por isso. A Direção me apoiou, elogiando meu trabalho, e a aluna reclamou novamente, porque ela não aceita um professor que seja “mossexual”, que não tenha valores, que não tem Jesus na vida, o que eu posso ensinar pra ela que não seja pecado? Eu ri baixinho enquanto a Diretora falava, a Coordenadora Pedagógica, até que foi me dada a palavra; e em dois anos trabalhando numa escola pública, tendo dado aula a mais de trezentos alunos, ela foi a única queixosa, ainda mais com relação a minha orientação sexual.
Sou incapaz de mudar a forma de pensar da sociedade. Sou incapaz de fazer com que uma aluna consiga enxergar além do estereótipo de professor gay, mas sou uma pessoa feliz, porque com o preconceito dela, dezenas de alunos se mostraram sem preconceito. Alunos gays me chamaram depois da aula pra perguntar se era verdade, pedindo orientação, pedindo conselhos.
Sou impotente diante dos problemas da vida, e incapaz de agir minha vida por mim mesmo, e tenho descoberto a cada dia que o importante é o que fazemos da nossa vida, e não como acham que vivemos.
Independente de sermos hetero ou gays ou lésbicas ou bi, homens ou mulheres, altos ou baixos todos nos deparamos com as pedras no caminho, obstáculos intransponíveis diante dos quais não podemos fazer muita coisa... mas um amigo muito importante pra mim disse que, se a pedra está no meio do caminho, podemos sempre passar pelos cantos da estrada; podemos escalar lentamente e descer do outro lado, podemos pedir ajuda pra movê-la, podemos quebrar os punhos socando e socando até que produza algum resultado.
E nós, mais propensos a solidão, escrevemos textos solitários, embalados por músicas chorosas que falam de perda.
Não vou dizer que não me chateei por ser estereotipado, mas sou impotente quanto a isso, e o preconceito de uns, a falta de conhecimento de uns só reforça as armaduras que forjamos pra encarar a vida.
Então, hoje, só por hoje eu vou cantar e celebrar a minha impotência, a minha necessidade de me apoiar em amigos e pessoas que me querem bem; vou celebrar cada vez que eu pedi ajuda, e cada vez que eu chorei e fui consolado, vou ficar feliz por cada insulto e xingamento que já recebi, simplesmente por saber que já recebi muitos mais elogios; vou reviver o momento em que fui espancado na porta da UERJ e meus colegas de curso me socorreram.
Sou impotente quanto a várias coisas no mundo, mas não quanto a tudo, e o que eu puder fazer pra mudar a realidade em que vivo, nem que seja escrever, nem que seja compartilhar o que eu penso e sinto (ainda que não seja do interesse de ninguém), eu vou fazer.

PS: Sei que é dia dos pais, mas não consigo escrever sobre coisas que não vivencio, deixo pros meus colegas, mas em todo caso, Feliz dia dos Pais!
PS2: Post sem imagens de forma proposital

Um comentário:

Sergio Cabral disse...

Sabe aquela velha máxima: Quanto mais conheço as pessoas...

Pois é.. eu odeio o ser humano.. não sei o motivo, mas eu tenho um pouco de medo e nojo.. não sei, é cada coisa que vejo que não consigo acreditar que um cachorro de rua é melhor que a gente..